Nos pequenos frascos existem grandes essências

Há 34 anos, chegava em São Paulo, vinda do estado do Ceará, Ivanira de Vasconcelos (57). Ao desembarcar na cidade mais pujante do Brasil, dona Nira, como é conhecida pelos amigos, sofreu na pele o simples fato de ser nordestina e mulher.

As zombarias aconteciam por conta do sotaque da nordestina e do local de onde veio. Entretanto, nada disso foi capaz de tirar a garra de dona Nira, que resolveu ficar na cidade aproveitando as oportunidades oferecidas, não voltando mais para o Sertão, onde levava uma vida bastante complicada.

No Ceará, Ivanira, irmã de seis homens e quatro mulheres, perdeu o pai muito nova, quando tinha apenas seis anos. A criação foi feita pela mãe e pela irmã mais velha. “Ali a gente não tinha uma expectativa de vida, não era fácil conseguir emprego. Quando me tornei adolescente percebi que era hora de tomar um rumo novo na vida”, afirma.

Depois de dois anos em seu novo estado, trabalhando como auxiliar de limpeza, Nira conheceu um segurança, que passaria a ser o seu companheiro e está ao seu lado há 32 anos. “Nosso namoro foi rápido, depois de um mês nós decidimos morar juntos”, revela.

Machismo
Naquela época a sociedade aceitava como natural o homem ser o chefe da família e as mulheres, infelizmente, ocupavam uma posição de submissão e se viam obrigadas a obedecer cegamente seus maridos, cuidando apenas dos afazeres de casa e da educação dos filhos. Porém, a valente mulher era uma exceção à regra e não concordava com a posição que era imposta. “Isso para mim era um preconceito. Não aprovava essa situação. Ainda bem que isso mudou e, hoje em dia, não digo que está de igual para igual, mas as mulheres estão conquistando cada vez mais seu espaço”, afirma.

A quebra do preconceito começou dentro de sua casa, no início do seu casamento, já que o marido também pensava que “mulher minha tem que ficar em casa”. “Meu marido era muito preconceituoso, ele é de Pernambuco e eu tive que dobrar o cabra. Eu queria trabalhar e ele não aceitava. Isso valia para qualquer mulher, já que no pensamento dele mulher que trabalhava fora saia para trair”, explica.

Com muita determinação, a esposa não se deixou sujeitar aos caprichos do marido e resolveu trabalhar, graças à ajuda das vizinhas que também não aceitavam a situação.

Voltando para casa após o primeiro dia no novo emprego, Nira encontrou seu marido Joab no ponto de ônibus aguardando o seu retorno. “Ele questionou onde eu estava. Disse que estava trabalhando e ele me disse para não voltar mais para o serviço, que se eu voltasse ele iria me deixar. Achei isso um absurdo, pois ele me conheceu no serviço. As semanas foram passando e, por fim, ele aceitou. Hoje é ele quem me arranja emprego”, confessa dona Nira aos risos.

O processo de mudança contra o machismo colocado dentro de sua própria casa foi lento, mas no final trouxe ótimos resultados. Joab era do tipo que acreditava que mulher não usava batom, shorts, não pintava as unhas, não cortava o cabelo, entre outras coisas. Porém, hoje em dia, o marido está bem mudado. “Ele era o que podemos chamar de homem das cavernas, mas isso eu consegui ir mudando aos poucos nele. Hoje quando vou no salão eu faço unha, corto o cabelo, faço a sobrancelha e ele acha a coisa mais maravilhosa, às vezes quando ele encontra minha cabeleireira até agradece por deixar a mulher dele mais bonita. Foi um processo longo, mas deu certo”, explica. “Hoje quem manda em casa sou eu!” enfatiza dona Nira.

Mercado de trabalho para as mulheres
Ela se recorda que quando chegou em São Paulo a maioria dos cargos de chefia eram ocupados pelos homens, mas observou que isso vem mudando ao longo dos anos. Sentiu que as coisas mudaram de uns 10 anos pra cá. Atualmente, Nira observa que os homens estão respeitando mais as mulheres e elas ocupando mais espaço no ambiente antes predominantemente controlado pelos homens.

Assédio no trabalho
A nordestina que já trabalhou de empacotadora de supermercado, recepcionista em loja, ascensorista de elevador, babá, entre outras funções exercidas, conta que a única situação que se lembra de ter sido assediada moralmente no serviço foi numa empresa onde seu chefe na época à paquerou. “Como naquele tempo não tínhamos muita informação sobre o que era assédio e quais eram nossos direitos, e eu precisava do emprego, fiz de conta que não estava acontecendo nada. Para a minha sorte ele não insistiu mais e eu continuei trabalhando normalmente. Resumindo, coloquei as coisas no devido lugar, ele na posição de patrão e eu na de empregada.” comenta Nira.

Criação dos Filhos: Homem x Mulher
Mãe de Joab, de 30 anos, que herdou o nome do pai, e Nayara de 17 anos, a guerreira afirmou que a criação de ambos foi igual dentro de casa, mas admite ter mais preocupação com a menina. “Não podemos deixar de ver o tanto de violência que acontece com as mulheres, vivemos num mundo que ainda é perigoso andar sozinha à noite”.

O que é ser mulher para você?
“É tudo de bom. As pessoas acham que mulher é sexo frágil, mas que nada, sexo frágil é o homem. Pra mim, mulher é o ser mais forte que existe. Antigamente as pessoas falavam que quando nasceu mulher vai ser sofredora e hoje em dia acabou isso, as mulheres estão vindo com tudo”, arremata.

A vida como ela é
Seguindo um ritmo de uma mulher do século XXI, Dona Nira diz amar a jornada dupla, da casa para o trabalho. Ela atua como auxiliar de limpeza na Prefeitura Municipal de Franco da Rocha, ama ficar em seu lar e cuidar dos seus bichos, os cachorros: Shake, Mimi, Marlon, Duque e a gata Amorinha.

Além de cuidar dos pets, Nira não deixa a vida cair na rotina. Sempre que pode, ela e o seu “bigodudo”, apelido que ela mesma deu ao marido, saem e quebram um pouco as atividades diárias da semana. “Às vezes, na semana mesmo, ele me liga e fala: Veia, vamos almoçar? É um gesto carinhoso, ainda mais depois de tanto tempo de casados”, finaliza Nira.

(Texto e foto: Paloma Cristina)


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